"Apaga sobre esse quadro as velas do pensamento."
Cecília Meireles
Não conheço mais
a lagoa
que sustentava
os braços dos barqueiros.
Não conheço mais
a lagoa
que escorregava
por-de-baixo
da ponte Feliciano Sodré,
como quem pede desculpas,
e vai passando...
Não conheço mais
a lagoa das barcaças
e dos remadores.
A lagoa ficou
confinada a poucos
metros de largura.
Os antigos diziam
que as águas desta lagoa
de vez em quando
escapuliam para o largo
da Matriz.
Os antigos contavam
estórias engraçadas
de bateiras pejadas de sal
com notas fiscais
especificando
tantas toneladas de cal.
Se acaso surgisse
um homem da lei,
um fiscal,
o documento era logo
alterado.
Uma cedilha, que mais parecia
uma cobrinha enroscada,
era colocada
debaixo do "c";
onde se lia "cal"
agora se lê "çal"
Tudo sumiu
no triangulo do Tempo.
O passado
foi esquecido
e sepultado
em nome do progresso.
Se me perguntarem:
— Como vai a lagoa?
Eu responderei:
—Não conheço mais
a lagoa
que sustentava
os braços dos barqueiros.
E acrescentarei:
A lagoa é a nostalgia
da minha insípida poesia.